sexta-feira, 11 de setembro de 2009


Vamo simbora que a peleja continua...



Apresentei limeirinha, deixei devendo, entretanto...



prosiei de seus absurdos
dos heróis, missais e santos
dos devaneios graúdos
apalhaçados quebrantos



mas agora chega a hora: apresento este indivíduo...



já chamaram "o sem parelhas"
" a cascavél do repente"
"o papa dos cantadores"
eu digo aqui sem temores
que esse poeta valente
na deixa pega ligeiro
orgulho da nossa gente:
pinto velho do monteiro.


PINTO DO MONTEIRO

Certa vez, Pinto cantando com um outro seu colega, este elogiava o Sertão, terra do velho cantador, e terminou uma sextilha assim:

Não sei medir o tamanho
dessa gente sertaneja...

Pinto pega na deixa e diz, com sua maneira autêntica de sertanejo puro e de versos fáceis:

Que eu esteja em casa ou não esteja
chegue, entre e arme a rede
coma se estiver com fome
beba se estiver com sede
se quiser se balançar
empurre o pé na parede.

De outra feita, numa dessas suas grandes e ferrenhas lutas, em seu desafio o parceiro termina uma sextilha assim:

quando eu for para o outro mundo
vou lhe promover a galo...

Facilmente, Pinto jogou esta sátira:

Se eu gozar desse regalo
concedendo a providência
quando eu for pra o outro mundo
havendo esta transferência
você vai como galinha
para a mesma residência.

Pinto era verdadeiro cantador de repente. Bem diferente dos que normalmente conhecemos, que seguem uma rotina. Ele não. Respondia ao que lhe perguntam e revidava conforme lhe feriam. Numa cantoria, seu colega querendo atacá-lo, disse:

Aqui nesta cantoria
eu quero deixá-lo rouco...

Pinto, com sua inesgotável idéia, responde:

Cantar com quem canta pouco
é viajar numa pista
com um carro faltando freios
o chofer faltando a vista
e um doido gritando dentro
atola o pé motorista.

Em toda cantoria há o momento dos elogios, em que o cantador faz uma exaltação ao ouvinte, para agradá-lo e a paga ser recompensável. Era uma delas, o velho Pinto elogiava um sujeito e tudo fazia para agradá-lo. O camarada foi se retirando e não pagou. Pinto notou que ele tinha uma verruga no rosto e, velho rei do repente que era, imediatamente soltou a dele, com esta
sextilha:

Eu não posso confiar
em cabra que tem verruga
cachorro de boca preta
terreno que não enxuga
comida que doido enjeita
e casa que cigano aluga.

(Extraído do livro ZÉ MARCOLINO - VIDA, VERSOS, VIOLA)

domingo, 19 de julho de 2009

Um poeta absurdamente absurdado


Saudações,

leitores da mais cara poesia...
Queria mostrar para vocês um "elemento" inusitado
que nasceu em meados do século XIX lá no sertão da
Paraíba. Mais precisamente no sítio Teixeira, região central onde passou a maior parte de sua vida.
Sobre ele, não se tem filmagens ou gravações.
As suas poesias encontram-se retratadas hoje em livros e cordéis e a maioria delas foi salva pela boa e velha tradição oral.

É conhecido como "o poeta do absurdo" , talvez
porque diga coisas absurdas e brinque com as tradições
católicas, bíblicas e com nomes de santos e heróis da história. Zé Limeira é a típica figura pictórica do universo sertanejo.
Dessa forma, sua poesia tem a marca registrada de não levar a arte poética a sério.

É, sem dúvida, de todos os poetas populares, juntamente com o velho pinto do monteiro,
o mais engraçado e desafiador da poesia popular quando o assunto é peleja poética.

Espero que divirtam-se bastante com essa pequena
demonstração da poesia do velho doido ( com todo respeito e admiração) Zé Limeira.


Repentes
Limeira¹ – O Poeta do Absurdo.


“Eu me chamo Zé Limeira
Da Paraíba falada,
Cantando nas Escritura,
Saudando o pai da coalhada,
A lua branca alumia,
Jesus, José e Maria,
Três anjos na farinhada”.

“Uma véia gurizada
Pra mim já é fim de rama,
Um véio Reis da Bahia
Casou-se em riba da cama,
Eu só digo pru dizê,
Traga o Padre pra benzê
O suvaco da madama”.

“Jesus foi home de fama
Dentro de Cafarnaum,
Feliz da mesa que tem
Costela de gaiamum,
No sertão do cariri
Vi um casal de siri
Sem comprimisso nenhum”.

“Napoleão era um
Bom capitão de navio,
Sofria de tosse braba
No tempo que era sadio,
Foi poeta e demagogo,
Numa coivara de fogo
Morreu tremendo de frio”.

“Meu verso merece um rio
Todo enfeitado de coco,
Boa semente de gado,
Bom criatoro de porco,
Dizia Dom Pedro Segundo
Que a coisa melhor do mundo
É cheiro de arroto choco”.

“São Pedro, na sacristia,
Batizou Agamenon,
Jesus entrou em Belém
Proibindo o califom,
Montado na sua idéia,
Nas ruas da Galiléia
Tocou viola e pistom”.

“Quando Jesus veio ao mundo
Foi só pra fazê justiça:
Com treze ano de idade
Discutiu com a doutoriça,
Com trinta ano depois,
Sentou praça na puliça”.

“Cantador pra cantar com Limeirinha
É preciso ser muito envernizado,
Ter um taco de chifre de veado
E saber decorado a ladainha,
Ter guardado uma pena de andorinha,
Condenar pra sempre o carnaval,
Guardar terra de fundo de quintal
E é preciso engrossar o pau da venta,
Beber leite de peito de jumenta,
Ediceta, pei-bufo, coisa e tal”!

terça-feira, 9 de junho de 2009

Improviso do Amor-Perfeito

Dia dos namorados chegando... Nesses versos da maestra
Cecília Meireles temos a espiritualidade presente em suas rimas. Sua poesia não fala da relação física mas do amor imaginado, sonhado. Para os românticos a ideia é fundamental, mas não é tudo. E os amantes que não possuem essa eterna busca pelo Amor-Perfeito não são dignos dEle.



Improviso do Amor-Perfeito




Naquela nuvem, naquela,
mando-te meu pensamento:
que Deus se ocupe do vento.
Os sonhos foram sonhados,
e o padecimento aceito.
E onde estás, Amor-Perfeito?


Imensos jardins da insônia,
de um olhar de despedida
deram flor por toda a vida.
Ai de mim que sobrevivo
sem o coração no peito.
E onde estás, Amor-Perfeito?


Longe, longe,atrás do oceano
que nos meus se alteia
entre pálpebras de areia...
Longe, longe... Deus te guarde
sobre o seu lado direito,
como eu te guardava do outro,
noite e dia, Amor-Perfeito.


Cecília Meireles

sexta-feira, 5 de junho de 2009

Estrelas do passado


Essa é mais uma obra autobiográfica de Maciel Melo intitulada "Estrelas do Passado", nesses versos simples maciel massageia a vida com suas experiências
surpreendentes e instigantes por terem o prazer de serem inacabadas e inacabáveis.

Já errei muito mais do que devia
Hoje estou começando a errar bem menos
Meus deslizes começam a ser pequenos
Bem menores que a ânsia de chegar
Eu sai sem saber como voltar
Eu segui os atalhos do destino
Apanhei pra deixar de ser menino
E hoje apanho tentando não errar

Já andei muitas braças, muitas léguas
Tive grandes e enormes bons amigos
Tive vários amores, tive abrigos
Tive abalos, caí, me levantei
Tive acasos, perdi, também ganhei
Meus pecados paguei em alto preço
Me perdoe se achar que eu mereço
Se mereço até eu nem mesmo sei


Sei que nada se perdera por completo
Ainda resta um restinho de esperança
Um fiapo, uma nesga de lembrança
De um passado feliz que me marcou
Um poeta, um boêmio, um cantador
Um balcão, uma prosa, uma piada
Um soneto, um repente, uma noitada
E uma canção pelas retinas desabou


Meu desafio pelas léguas caminhou
Fui ferido e feri quem me feriu
E ferindo, a ferida se abriu
Nunca mais suturou, tornou-se chaga
E uma canção de amor me embriaga
Em doses de versos Buarqueanos
E uma bandeira branca em fino pano
Bem no seio de minha alma foi fincada


Foi ficando cada vez mais hasteada
E bem no alto tremula irradiante
Acenando aos poetas mais errantes
Quero paz e o resto a gente enterra
Qualquer mágoa nesse instante se encerra
Meu abraço abre os braços para os teus
E se teus braços chegarem junto aos meus
Eu abraço e nunca mais teremos guerra.

Canção do mês: "Sem ouro e sem mágoa"


Pra começar...
Nada melhor do que uma boa poesia sertaneja
Com o cheiro da terra e a maestria de Maciel Melo,
um dos maiores cantadores vivos desse sertão tão belo.

"Sem ouro e sem mágoa" é a música título de seu mais novo trabalho, no qual o mesmo compartilha várias canções com nomes como Santana e Silvério Pessoa.
Espero que se deleitem com essa música tão bela que é uma parceria entre ele e Fausto Nilo.



Sem ouro e sem mágoa

Me disseram que a noite é de lua na casa do rei
Eu também sou um rei nessa rua, na casa da solidão
Uma rosa ilumina meus olhos cansados de ver
A mentira subindo pró céu e a verdade no chão

Chega de fumaça do sereno,
chega que o veneno tá demais
Ê, minha nega, não chora que o tempo se atrasa
A saudade é uma casa caiada coberta de gás

Pelo o que a sanfona tá dizendo
Isso aqui também tá bom demais
Ê, vida boa, me leva sem ouro e sem mágoa
Sou cavalo que não bebe água e nem olha pra trás

Mas se ela quiser me levar na cachoeira
Pra esquecer dessa besteira, eu rastejo aos seus pés
Quando acabar de cantar a saideira

Minha alteza companheira que beleza que tu és.